O Nazismo e o Integralismo no Vale do Itajaí

O período entre-guerras (1918-1939) foi uma época de grande confusão no campo político e ideológico no Ocidente. 

A Primeira Guerra Mundial (1914-1918), ainda pouco estudada por nós (erroneamente, pois, este conflito foi o marco inicial do século XX, e suas consequências são sentidas até hoje, 102 anos depois de seu fim) sepultou de vez o romantismo do século XIX, e colocou a humanidade frente a frente com a sua própria brutalidade. 

Foi um período de efervescência ideológica, provocada principalmente pelo trauma deixado pela guerra. Na extrema-direita, surge na Itália, o Fascismo, na Espanha, a Falange e na Alemanha, o Nazismo. À esquerda, a Revolução Russa é consolidada e forma-se a União Soviética, o primeiro estado socialista da história. 

E no Brasil?

Igreja evangélica de Neu Bremen (hoje Dalbérgia), com a bandeira Nazista

Também vivíamos um processo de transição bastante conturbado. A República, proclamada no fim do século XIX estava consolidada, em um regime que ainda privilegiava os barões do café, também detentores do poder no Império. O Brasil era um país que não conseguia sair do modelo econômico imposto ainda na época colonial: a monocultura de exportação e mão de obra barata. Não mais a escravidão, abolida um ano antes da República, mas um grande proletariado rural vivendo em um sistema semi-feudal, e no sul do país, centenas de imigrantes reproduziam suas pátrias de origem em suas colônias isoladas em rincões antes inóspitos. Esta era a chamada "República Velha".

Foi neste cenário, no final da década de 1920, que surge na política nacional um movimento chamado Tenentismo. Fruto da insatisfação da baixa oficialidade do exército com o regime implantado em 1889, eram contrários ao sistema político que surgiu para manter o controle dos barões, através do "voto de cabresto" (submissão dos eleitores ao controle dos chefes políticos locais, que determinavam em quem se devia votar). 

Apesar de não ter produzido resultados imediatos na estrutura política do Brasil através da insurreição armada (como a Coluna Prestes e a Revolta do Forte de Copacabana), o Tenentismo pavimentou o caminho para mudanças estruturais no Brasil. Em 1930, uma revolução com o apoio dos Tenentes revoltosos tomou o poder e pôs fim à República Velha, instalando na presidência um dos personagens mais importantes da história do Brasil: Getúlio Vargas.

Com o governo de Getúlio Vargas, surgiram o voto feminino, leis trabalhistas e sindicatos. E novas ideologias ganhavam corpo. À esquerda, o PCB (Partido Comunista do Brasil) fundado em 1922 ganha forte adesão nas Forças Armadas e na intelectualidade urbana. Um dos líderes tenentistas mais importantes, Luís Carlos Prestes, adere ao PCB em seu exílio no Uruguai e torna-se um dos seus dirigentes. À extrema-direita, a principal força é a Ação Integralista Brasileira, fundada em 1932 pelo escritor e jornalista Plínio Salgado.

Com uma ideologia e estética semelhante ao Nazismo e ao Fascismo, o Integralismo era um típico movimento de extrema-direita dos anos 20, pregando os mesmos clichês: foco na tradição, real ou imaginada, em oposição às políticas e costumes que são consideradas resultado do "modernismo", que pretende "destruir" a nação, e somente eles poderiam "resgatar" os valores tradicionais da Pátria e levá-la à "grandeza". Em 1936, auge do movimento, chegaram a ter perto de 1 milhão de membros em todo o país. Após a implantação do Estado Novo em 1937 e uma tentativa de golpe em 1938, o Integralismo foi posto na ilegalidade e despareceu na história. Hoje, é visto mais como uma caricatura do que levado à sério.

Mas, na época ele era levado muito à sério. Nas colônias alemãs, sobretudo. 

Integralistas em Blumenau

Com a ascenção de Hitler ao poder na Alemanha, muitos colonos ficaram entusiasmados com o "reerguimento" da sua pátria. Algumas cidades da região (incluindo a nossa) possuíam células do partido Nazista, e bandeiras com a suástica eram erguidas com todo o fervor pelos colonos. Mas havia um problema: o partido de Adolf Hitler não aceitava em suas fileiras - mesmo no exterior -  os descendentes de alemães. Apenas pessoas nascidas na Alemanha podiam participar. Com toda uma estética e ideologias semelhantes ao Partido Nazista, o Integralismo foi a saída para os colonos de segunda geração de participar do que estava acontecendo. 

A adesão ao integralismo foi tão grande em nossa região que elegeu prefeitos e vereadores. Nossa cidade teve um prefeito integralista - Frederico Schmidt, eleito em 1936. Blumenau, inclusive, foi considerada "Cidade Integralista", e abrigou até mesmo um congresso do partido em 1935, que contou com a presença do "chefe" Plínio Salgado. 

Reunião do Partido Nazista em Hammonia

Com a proibição do Partido Integralista e do Partido Nazista em 1938, houve uma grande perseguição aos seus adeptos, especialmente se fossem imigrantes e descendentes. Em nossa cidade, o Prefeito Schmidt foi destituído pelo governador Nereu Ramos e um interventor foi nomeado (Rodolfo Koffke). A campanha de nacionalização imposta pelo Estado Novo deixou muitos traumas na população de origem alemã no Vale do Itajaí. Houveram prisões e torturas, e até mesmo o idioma foi proibido. Com a entrada no Brasil na Segunda Guerra Mundial e o rompimento das relações diplomáticas com a Alemanha, a perseguição se intensificou. O imigrante era o inimigo.

Congresso Integralista em Blumenau (1935). Ao Centro, Plínio Salgado

A situação acalmou-se após o fim da guerra e do Estado Novo em 1945, mas os traumas e o ressentimento permaneceram, por causa daqueles que foram perseguidos injustamente, e em nossa sociedade, que mesmo no século XXI, continua a dar voz a ideologias tão perversas.

O Blog recomenda o filme "Anauê - o integralismo e o nazismo na região de Blumenau" do cineasta catarinense Zeca Pires. Um grande documento sobre esta época, contando com a participação de Ibiramenses, dando depoimentos sobre o período. Disponível no link: https://www.youtube.com/watch?v=srcitNSPXgQ&t=204s

Autor: Cleandro G. Boeira, Museu Municipal Eduardo de Lima e Silva Hoerhann